Acaso

Uma biblioteca quase vazia. Silêncio.

Ela estudava matemática, ele estava ali apenas de passagem - vinha entregar um livro do qual havia alugado para um final de semana qualquer.

Mordiscando o lápis, ela resolvia uma equação algébrica. Não ousou a ele passar outra coisa pela cabeça a não ser quão belo eram os lábios da garota.

No cabelo pendia uma caneta, na mesa o material estava espalhado.

Passou por ali vistoriando tudo, e no dia seguinte após fitar a mesma cena, ousou-se por fim se aproximar.

- Posso ajudá-la? - pigarreou ele

- Talvez sim.

- Álgebra?

- Infelizmente.

Ela sorriu com simpatia, puxou uma cadeira o convidando a sentar.

- Entende algo sobre?

- Não sei ao certo, mas posso tentar lhe dar uma mãozinha.

- Já seria um bom começo.

E como seria...

E ficaram assim, durante semanas. Ele, seu novo professor, e ela uma aluna prendada e pra lá das mais simpáticas. A aluna que questionando aqui e ali plantou-lhe um ponto de interrogação sem fim em seu peito: O que sinto por ela? Por que me falta o ar e, principalmente, palavras quanto estou tão perto dela? Quase posso tocar seus cabelos, lhe fazer tranças, lhe beijar a nuca; quase me intoxico com seu perfume... tão doce, tão pura.

Foi quando estudavam que ele ousou arriscar mais uma vez...

- Estava pensando em como lhe perguntar... - começou ele.

- Tem alguma dúvida em alguma matéria? - ela o interrompeu quase que espontâneamente - Sabe que se tiver lhe ajudarei, assim como você me ajuda com matemática.

Arrancou- lhe as palavras, nisso ela era ótima. Não apenas nisso, lógico. Para ele, ela era absurdamente perfeita em tudo, até no jeito que tossia quanto como ria.

Mais que depressa tratou de pegar uma caneta abandonada em meio aos livros de pesquisa, e acrescentar algumas coisinhas no tal exercício.

- Poderia me ajudar mesmo?

- Claro que sim. De que matéria se trata?

- Biologia. Genética. Sou um traste em humanas. - brincou ele.

- Sei como é. Metade das pessoas que vão bem em exatas, são péssimos em humanas.

- Gosta de biologia?

- Está brincando! Adoro. Minhas notas são excelentes em biologia. Pena que não possa dizer o mesmo em matemática...

- Poderia me dar uma dica? Uma explicação? Sei lá...

- Claro que sim.

- Poderia resolver esse exercício pra mim? Não sei como resolver...

- Deixa eu ver...

09- (PUC-SP) No homem, a sensibilidade ao PTC é devida a um gene dominante P e a insensibilidade, ao seu alelo p; o uso da mão direita é devido a um gene dominante C e o da mão esquerda, ao seu alelo c. Um homem canhoto, sensível ao PTC, casa-se com uma mulher destra, também sensível. O casal tem 4 filhos canhotos, sendo 2 sensíveis e 2 insensíveis. [...]

E no finalzinho do exercício continha letras garanchadas, embora legíveis. Ele as tinha feito na pressa.

Quer namorar comigo?

E ela sorriu.

Talvez tenha sido um sim.